19/01/2021 às 16h35min - Atualizada em 19/01/2021 às 15h35min

É POSSÍVEL PROCESSAR O PARCEIRO QUE CONTAMINA O OUTRO COM INFECÇÃO SEXUAL?

Saiba como lidar com essa situação e entenda seus direitos

SUAIMPRENSA - cidadenoar.com


No dia 14 de janeiro, a ex-namorada de Nego do Borel, Duda Reis, registrou um boletim de ocorrência de agressão, estupro e transmissão de HPV contra ele e fez constar no BO que "(...) foi traída diversas vezes pelo autor sem que soubesse, e que contraiu HPV do então companheiro. Duda só teve um parceiro sexual antes do agressor, que manteve relação sexual com outras mulheres...”.

O que Duda fez – denunciar seu ex-namorado – tem respaldo legal, como explica a advogada e pós-graduanda em Sexualidade Humana, Natalia Viotti.
Abaixo ela esclarece como se posicionar ou agir em casos similares. Veja:
 
  1. Qual a pena para quem transmite infecções sexuais?
Nosso Código Penal Brasileiro, em seu artigo 130 prevê que: “é crime expor alguém por meio de relação sexual ou qualquer ato libidinoso, ao contágio de moléstias venéreas, de que sabe ou deve saber que está contaminado”, explica a advogada Natalia Viotti.

Esse tipo penal determina que para haver punição é imprescindível que haja intenção de expor a vítima ao risco, ou seja, o acusado tem que saber que tem a infecção e agir com culpa consciente ou dolo eventual. Nesses casos a punição é de 03 meses até 01 ano em regime semi-aberto, podendo ser convertido em multa, porém, quando há intenção de transmitir, ou seja – havendo dolo – a pena vai de 01 a 04 anos de reclusão em regime fechado.

No caso em destaque temos uma relação que deveria ser de confiança e lealdade, pois eram namorados, razão pela qual a Lei Maria da Penha também poderia ser trazida ao debate mesmo que não houvesse as outras denúncias, como de agressão e vários tipos de violência doméstica.

A gente precisa começar a enxergar a traição como um aspecto que gera danos emocionais ao outro, pois traz uma série de questionamentos quanto à capacidade, valor, aceitação e merecimento, que têm o condão de despertar gatilhos emocionais e até contribuir para depressão, crises de ansiedade e pânico. Se tem algo que a sociedade precisa entender com urgência, é o que chamamos de ‘responsabilidade afetiva’, ou seja, o quanto das nossas atitudes – ou falta delas - refletem no outro e de que forma podemos ser mais contribuição e menos destruição”, relata Natalia Viotti.

A cada dia vemos os índices de mulheres com IST’s aumentando, como também têm aumentado em idosos, e tudo isso pela ‘cultura’ de que a camisinha aperta, ‘não cabe’, ‘é como chupar bala com papel’, etc. Todo mundo conhece uma amiga que começa a sair com um carinha e logo na primeira noite não usa camisinha. As justificativas são inúmeras, e muitas vezes ela nem sabe se ele tem ou não outra pessoa, ou seja, vai se formando uma teia de pessoas que se relacionam e trocam secreções, energias e até infecções.

Se só a traição já é algo perturbador, imagine quando vem acompanhada de resultados positivos para infecções sexuais? A mulher passa a ter medo até de como se comportar, medo de denunciar, de contar para as amigas, de falar para as outras mulheres que tiveram relações com ele. São preocupações que os homens nunca terão, e por isso é tão delicado vermos julgamentos sobre como cada uma se coloca em cada situação vivida. É importante que saibamos nosso lugar de fala, respeitando e apoiando a mulher que resolve expor o contexto, isso se chama empatia.”, diz Natalia.
 
  1. Devo denunciar? Como fazer?
A mulher que passa por uma situação como essa deve procurar uma advogada ou a Defensoria Pública do Estado obter e preservar as provas já existentes, que podem ser exames médicos e conversas de WhatsApp que comprovem que o acusado sabia ter a infecção.

Ela vai precisar fazer um boletim de ocorrência e requerer a representação para que o caso seja investigado, quando só então o caso será encaminhado ao judiciário. A advogada Natalia Viotti explica que mesmo o acusado dizendo que não tinha ciência da infecção, ele pode ser punido, pois existe uma interpretação que que se você se relaciona com outras pessoas sem o uso de preservativo, você sabe que está se expondo ao risco de ser contaminado, e isso já demonstraria a falta de cuidado e poderia caracterizar a culpa consciente.

Algo que as mulheres não sabem é que, se durante o ato sexual ele a retira de propósito e sem que ela perceba, ela também pode denunciá-lo, pois está limitando ou anulando seus direitos sexuais, que é algo que a Lei Maria da Penha também traz, explica Natalia.
 
  1. O contra-ataque
Algo que comumente percebemos é que quando uma mulher faz uma denúncia de crime sexual, em instantes ela sai da posição de vítima e vai para a posição de algoz. A desqualificação da mulher é resposta certa dos homens, e aí aparecem os clássicos ‘ela é louca’, ‘ela quer aparecer’, ‘ela quer dinheiro’, ‘está me difamando, caluniando ou injuriando’.

Decidir denunciar é um ato de coragem, que só sendo mulher para ter a dimensão da consequência que dela poderá resultar e significar para sua vida.
 
  1. Uso de preservativo: um ato de respeito e cuidado com a própria saúde
Além de advogada, Natalia fez formações voltadas à sexualidade consciente e vê esse assunto, que é extremamente delicado, com uma abordagem mais ampla. “É preciso trabalhar a consciência corporal das meninas desde a adolescência, fazer com que entendam seu valor a fim de que não fiquem vulneráveis emocionalmente a ponto de aceitarem sexo sem proteção só porque o namorado diz que ‘não tem nenhuma doença’, que isso ‘é uma prova de amor’, que ‘ele só faz sem camisinha com ela’, etc. Essas frases certamente já foram ouvidas pela maioria das mulheres ou, aquelas que nunca tiveram essa infelicidade, conhecem alguém que já ouviu. Por isso é preciso mudar nossa cultura em relação ao sexo e o lugar da mulher dentro deste contexto, e isso é urgente! Não basta educação sexual, temos deficiências afetivas profundas e que muitas vezes transferimos para o parceiro, o que nos coloca em posição vulnerável.

“Mulheres permanecem em relacionamentos abusivos por medo de não serem amadas. Mulheres apanham porque acham que merecem. Mulheres são estupradas por seus maridos e se calam porque acham que esse é o papel delas. Mulheres transam sem camisinha porque são inseguras e têm medo de que se insistirem, o cara vai embora. O problema não está na superfície, temos um iceberg gigantesco para desconstruir, mas percebo uma mudança significativa no comportamento feminino, e isso é muito bom. Torço e luto para que nos apoiemos cada vez mais e mais”, afirma Natalia.
 
Natalia Viotti é advogada, Sócia de Gouvêa Vieira Advocacia, Especialista em Direito Direito Empresarial e Saúde da Mulher. Possui Extensão em Gestão de Pessoas e Compliance pela FGV e Aspectos Jurídicos da Violência Obstétrica tanto pelo Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde de São Paulo, como pela PUC-Rio. É também facilitadora de consciência, certificada internacionalmente pela Access Consciousness® e pelo Instituto Think®, como Thetahealer. É Doulacom ênfase no pós-parto, Consultora de Amamentação pelo Hospital Albert Einstein, Condutora de Círculos de Mulheres e de Imersões Femininas, idealizadora da Ciranda Cíclica® (plataforma de estudos e saberes femininos milenares) e Diretora Jurídica da BrazMa Consultoria. Seu trabalho com mulheres é focado na advocacia humanizada e no despertar do poder feminino, na sexualidade consciente, na relação saudável com a menstruação, ciclos, e expansão da consciência como técnica para alcançar objetivos e realizar sonhos. “Acredito que somos seres infinitos, e por isso nada está fora do nosso alcance. O que mais está disponível para você que você ainda não considerou?”, diz Natalia.
 
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